Diante da pressão de reguladores, Facebook muda gestão e estratégia
ÉPOCA NEGÓCIOS – 12/08/2019
A senadora democrata Elizabeth Warren já defendeu a divisão de grandes empresas de tecnologia como o Facebook. Órgãos reguladores abriram investigações sobre o domínio da companhia no mercado de redes sociais. Até mesmo um dos fundadores do Facebook já pregou que ele deveria ser dividido em empresas menores. Diante da pressão, a maior rede social do planeta começou a mudar seu comportamento e sua gestão estratégica, de maneira preventiva e e defensiva, buscando se proteger de potenciais questionamentos e escrutínios.
No fim do ano passado, o Facebook travou as negociações para a aquisição da Houseparty, uma rede social de vídeos no Vale do Silício, por temer investigações antitruste, segundo pessoas a par do assunto. Adquirir outra rede social quando já se é um player dominante nesse mercado se mostrou algo muito arriscado, disseram as fontes, que preferiram não ser identificadas porque as discussões eram confidenciais.
O Facebook também começou a fazer mudanças internas para que uma eventual divisão de seus negócios se torne mais difícil. A companhia está unificando os sistemas de mensagens de Messenger, Instagram e WhatsApp, e reorganiza departamentos de modo que o Facebook fique claramente no comando, revelaram duas fontes com conhecimento do assunto.
Executivos também vêm trabalhando em novas estratégias de marca (rebranding) para Instagram e WhatsApp para associá-los mais fortemente com o Facebook.
Essas mudanças geram um novo debate: será apenas uma estratégia mais inteligente de negócio ou aumenta potencialmente práticas anticompetitivas? O fundador e diretor executivo da rede social, Mark Zuckerberg, repete que a empresa enfrenta concorrência de todos os lados e que está relutante em fragmentá-la. Não quer perder o Instagram e o WhatsApp, que são enormes e podem continuar incrementando o negócio de US$ 56 bilhões do Facebook.
— A questão é, trata-se de lum plano de negócio lógico? — questiona Gene Kimmelman, ex-funcionário no setor antitruste do governo de Barack Obama e conselheiro da Public Knowledge, grupo de pesquisa em Washington. — Para uma rede social com um crescimento imenso em fotos e mensagens, há, provavelmente, justificativa empresarial para combinar as unidades.
Mas o deputado David Cicilline, do Partido Democrata e presidente da Subcomissão Antitruste da Câmara de Representantes, acha que as mudanças do Facebook devem ser examinadas.
— A combinação de Facebook, Instagram e WhatsApp na maior plataforma de comunicações da história é uma clara tentativa de escapar do cumprimento de leis antitruste, tornando a empresa mais difícil de ser dividida. Precisamos apertar o botão de pausar.
O Facebook, por sua vez, nega que a ideia com a mudança de estratégia seja prevenir uma separação de suas unidades.
— Criar mais maneiras de as pessoas se comunicarem com nossos aplicativos tem a ver com beneficiar mais os usuários, é só isso — diz Stan Chudnovsky, vice-presidente de Messaging do Facebook. — As pessoas querem alcançar o máximo de gente possível com o app de mensagens que escolherem.
Em Washington, o Facebook acompanha de perto a Comissão Federal de Comércio (FTC), que investiga a empresa por práticas anticoncorrência, segundo as fontes. A agência descobriu em 2018 documentos que geraram temores sobre a maneira como a rede social estava adquirindo rivais no mercado, dizem elas.
A longa lista de aquisições de Zuckerberg (Instagram em 2012 e WhatsApp em 2014, entre muitas outras companhias) foi alvo de críticas entre especialistas e gestores de políticas econômicas por reduzir a concorrência. Eles argumentam que a empresa é uma “compradora defensiva” de companhias para proteger seu domínio.
Este ano, a FTC pediu autorização ao Departamento de Justiça dos EUA apara abrir uma investigação antitruste sobre potenciais comportamentos anticompetitivos do Facebook, disseram pessoas próxima sao processo. Nos últimos dois meses, a agência entrou em contato com fundadores de empresas adquiridas pelo Facebook nos últimos 15 anos, para saber mais sobre suas práticas de aquisição, revelaram quatro pessoas com conhecimento das investigações.
Quando o escrutínio oficial aumentou, o Facebook travou as conversas para comprar a Houseparty, rede social de chat de vídeos em smartphones fundada em 2016 por ben Rubin e Sima Sistani e bastante popular entre jovens de menos de 24 anos. O Facebook, cujos usuários estão envelhecendo, cobiçava membros mais jovens, segundo as fontes.
Disseram aos executivos da Houseparty que uma aquisição naquele momento chamaria a atenção do governo dos EUA para o Facebook. A Housepartiy acabou sendo comprada mais tarde pela Epic Games, dona do videogame Fortnite.
As mudanças empreendidas pelo Facebook para tornar mais difícil a divisão de seus apps começou há mais de um ano e visam combinar a infraestrutura de Messenger, Instagram e WhatsApp. O projeto, chamado de “interoperabilidade”, requer anos de trabalho duro em engenharia de software.
Segundo pessoas a par da estratégia, o objetivo, em parte, é criar uma rede unificada. Publicamente, Zuckerberg diz que a iniciativa ajudará a construir uma versão mais “privativa” do Facebook, de modo que os usuários possam “se comunicar através das redes de um jeito mais fácil e seguro” com os sistemas de mensagens, com uma experiência melhor de usabilidade nos aplicativos. Também ajudaria, segundo Zuckerberg, o WhatsApp a ficar mais lucrativo.
Embora os funcionários de Facebook, Instagram e WhatsApp trabalhem em prédios diferentes, executivos demandaram que compartilhassem mais seus recursos e reorganizaram seu organograma. Por exemplo, diretores do Facebook ordenaram que a divisão do Instagram se reportasse aos diretores do Messenger, revelou a Bloomberg.
O Facebook também iniciou no ano passado um projeto de mudança de estratégia de marca, em que seu nome passaria a preceder os de WhatsApp e Instagram, com a ajuda de uma agência externa, a Prophet Brand Strategy.
Uma pesquisadora independente de segurança, Jane Manchun Wong, descobriu a marca “Instagram do Facebook” escrita em algumas linhas de programação em março passado.
Os funcionários de Instagram e WhatsApp, até então acostumados a ter mais autonomia, ficaram irritados com as mudanças, segundo fontes familiares com os setores.
Na verdade, desde junho de 2018 a unificação já parecia estar em marcha. Foi quando o Facebook criou uma métrica combinada que evitava designar os usuários de cada aplicativo, tabulando conjuntamente a utilização dos serviços da rede social.