Como as redes sociais e o excesso de conteúdo estão destruindo nossas certezas

Como as redes sociais e o excesso de conteúdo estão destruindo nossas certezas

2 de maio de 2019
Última atualização: 2 de maio de 2019
Helio Gama Neto

ÉPOCA – 01/05/2019

Bárbara Libório

Nove horas e 14 minutos. Isso é quanto tempo um brasileiro passa por dia, em média, na internet. Mais de três horas são usadas para acessar as redes sociais — Whatsapp, Facebook, Twitter, Instagram, etc —, que já são também a maior fonte de consumo de notícias. Google, Facebook e Youtube são os sites mais acessados da web, seguidos por dois grandes portais de notícias. Parece muita informação? E é. Segundo uma pesquisa do Consumoteca Lab, a dificuldade de assimilar todo o conteúdo ao qual somos expostos diariamente, junto ao excesso de opiniões nas redes sociais, e a necessidade que cada um tem de fazer o seu ponto de vista se sobressair, causa à sociedade uma sensação de caos — que destrói as antigas certezas e convicções sobre o mundo. É o chamado “espiral da verdade”.

Segundo a pesquisa, que ouviu mil entrevistados em todo o Brasil, 78% dos brasileiros são incapazes de assimilar todo o conteúdo a que são expostos diariamente. “Estamos todos perdidos em relação ao que antes era certeza”, diz Michel Alcoforado, antropólogo e sócio fundador da Consumoteca. “Foi o que aconteceu com a festa da diretora da Vogue: as pessoas dormiram pensando que queriam estar lá e amanheceram sabendo que era uma festa racista — nem a própria Donata sabia que era. E aí, logo depois, vieram as baianas dizendo que não, não era racista. Mais uma vez, caimos no espiral da verdade”, explica. Mas ainda que as pessoas se sintam sobrecarregadas pelo acúmulo de conteúdo, elas não conseguem deixar de consumi-lo — e nem de produzi-lo: 66% dos brasileiros abrem as redes sociais assim que acordam, e 33% postam imediatamente nas redes sociais tudo que acham interessante.

O estudante Emerson Silva, de 20 anos, chegou a ter uma crise em seu namoro por causa do uso exagerado do smartphone. “Começamos a brigar muito por isso e tivemos que combinar que, quando estamos juntos, não usamos o celular”, conta. “Eu posso ficar nas redes sociais o dia inteiro: em casa, no trabalho, no curso… O celular parece meu melhor amigo”. Não raramente, o jovem se vê envolvido em debates sobre temas polêmicos nas redes. “Depende do quanto o assunto me irrita”, brinca. A fonte de informação para embasar as discussões muitas vezes é o Google. “Se eu não tenho como rebater um argumento, eu jogo no Google, aí volto depois de uma hora para continuar a discussão”, diz Silva.

O Consumoteca Lab contabilizou quantos dos entrevistados mudaram de opinião sobre um assunto após debatê-los nas redes: 69% disseram que não. Pois é. O problema é que, apesar de democratizar a informação, o que chamamos de polifonia digital, a internet também gera ruído: com mais vozes discordantes começando a se posicionar, o resultado muitas vezes é o conflito. Isso porque as opiniões se baseiam, principalmente, em experiências pessoais: 78% das pessoas a consideram muito importante para opinar.

Já quando se tratam de fatos e dados, a tendência é usá-los para reforçar argumentos. É o que a Consumoteca cheia de boia factual: em meio a um mar de argumentos, nos agarramos a qualquer boia de informação — seja verdadeira ou não, faça sentido ou não — para reforçar nossa opinião. E como a origem ou fonte da informação ficam em segundo plano, é comum que o conteúdo compartilhado não seja verdadeiro: 72% dos brasileiros já se sentiram enganados por “fake news” — metade deles diz não ter tempo sequer de checar as informações que recebe por Whatsapp.

“As pessoas não estão mais acostumada com a verdade.Elas estão querendo o que as permite dormir tranquilas”, diz Alcoforado. gente vai ter que se acostumar. “E não sou muito otimista sobre esse cenário. Vamos ter que nos acostumar. Hoje, os algoritmos e a tecnologia nos mostram o que a gente quer: nas redes sociais, nas compras, nas notícias… A vida real é uma grande ficção e todo mundo quer ser o melhor escritor.”


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Helio Gama Neto