TCU, entidades e ministros debatem critérios para publicidade federal
PROPMARK – 11/08/2020
Jéssica Oliveira
O Tribunal de Contas da União (TCU) realizou nesta terça-feira (11) o “Painel de Referência – Critérios técnicos para alocação de verbas em campanhas publicitárias do Governo Federal”.
Recentemente, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) abriu processo de concorrência para contratar três agências de publicidade. O contrato prevê valor de R$ 270 milhões ao ano.
A abertura foi feita pelo presidente do TCU, Ministro José Mucio Monteiro. De acordo com o ministro Vital do Rêgo, o TCU tem se deparado com vários processos que discutem as questões da área de comunicação e de publicidade, entre os quais um que trata de uma eventual alteração no padrão de alocação dos recursos nas campanhas informativas do governo federal – tema da reunião. “Tenho a firme convicção de que é interesse das entidades que participam desse debate que os recursos públicos sejam bem aplicados com eficiência e em prol do cidadão. É absolutamente necessário que os processos se sustentem em critérios técnicos, objetivos, impessoais e aferíveis. Embora se compreenda a complexidade das múltiplas variáveis que gerem a comunicação, faz-se imprescindível um regramento claro a ser seguido. É igualmente importante que haja plena transparência de toda a cadeia de tomada de decisão de modo a permitir a devida fiscalização”, disse.
Para Bruno Dantas, também ministro do TCU, falar de recursos públicos para a comunicação governamental, em especial tentando conciliar os princípios da Constituição e leis com o combate às fake news e discurso de ódio, é uma contribuição inestimável do TCU. “Esse debate será paradigmático e creio eu poderá traçar um caminho seguro para que o Brasil se afaste dessa prática nefasta que se tem observado no mundo inteiro, que é a monetização de sites que cultivam o ataque às instituições, o discurso de ódio, a desinformação e a mentira”, comentou.
Ele frisou que há um certo jogo de empurra entre empresas estatais, Secom e o Google AdSense: o governo diz que não controla os sites que o algoritmo escolhe, e o Google diz que o cliente pode excluir os sites que deseja. “Nessa distribuição de responsabilidades, de quem é a culpa?”, provocou.
Ainda em sua opinião, não cabe ao TCU ou qualquer instituição brasileira auditar o algoritmo da empresa, uma vez que o modelo de negócios do Google deve gozar de liberdade quando atua no setor privado. Mas há um porém: “Quando falamos do princípio da legalidade com o setor público e se o Google decide fazer negócios com o estado brasileiro, ele deve se sujeitar ao artigo 37, da legalidade estrita, segundo o qual o administrador e quem o contrata com administração pública somente pode fazer o que está previsto na legislação brasileira. Se o algoritmo do Google não é compatível com a Constituição brasileira, não é compatível com as leis brasileiras, o estado brasileiro não pode contratar o Google Ad Sense para suas campanhas publicitárias. Eu estou amadurecendo isso”, refletiu
De acordo com Fabio Faria, ministro das comunicações, a Secom reduziu em cerca de 45% a verba ao longo dos últimos cinco anos. “E este é um ano excepcional, por conta dos avisos sobre relacionados à Covid”, pontuou.
Tânia Lopes Chioato, secretária de Controle Externo de Aquisições Logísticas (Selog) do TCU, apresentou alguns conclusões e propostas da análise técnica sobre as representações feitas ao Tribunal.
Um dos pontos que ela chamou atenção foi para uma parte do processo entre o briefing e a realização que não está bem documentado. “Os diversos ajustes realizados no plano de mídia, que é nessa fase de processo interativo de análises e alterações, não ficam registradas. Nesse momento perde-se a possibilidade de rastrear os acontecimentos e as motivações que conduziram o processo decisório desde a proposta inicial até chegar a versão final do plano que orienta a distribuição desses recursos”, disse.
Para a profissional, dois achados se sobressaem da análise técnica: o primeiro é a carência de critérios técnicos objetivos para a distribuição das verbas publicitárias. A simples régua de share não pode espelhar por si só, não representa sozinho uma condição essencial de economicidade e efetividade. É necessário considerar outras variáveis como absorção de conteúdo, público-alvo, alcance populacional, frequência de veiculação e o custo das inserções. Ocorre que esses critérios técnicos precisam ser claros e estarem detalhados no processo administrativos. O segundo ponto é a ausência de registros de revisões e alterações no plano de mídia. Ele deve ser utilizado para fins de fiscalização também. Assim como acontece com as demais contratações públicas, todas as justificativas técnicas e econômicas para as opções realizadas devem constar no processo”, comentou.
De acordo com Samy Liberman, Secretário Especial Adjunto da Secom da Presidência da República, comentou que para alcançar o Brasil inteiro, podem escolher a emissora líder ou fazer um mix de comunicação que possui alcance equivalente, porém maior economicidade e melhor frequência. “No caso da previdência utilizamos rádio, TVs, jornais etc, conseguimos um alcance maior, por exemplo”, disse.
Segundo ele, a Secom não investe diretamente em nenhum site e o Google Ads é uma ferramenta usada pelas agências, nesse caso a Artplan. Ele também disse que concorda com a sugestão do TCU de documentar o processo de decisão. “Uma campanha chega a ter 10, 15 idas e vindas, porque há muitas alterações. Mas as decisões são muito técnicas”, afirma.
Glen Valente, Secretário de Publicidade e Promoção da Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República, avalia que existem pontos a serem debatidos para entender se é a ferramente correta a ser utilizada. “Nosso interesse básico é ser técnico, eficiente e transparente para ter segurança e tranquilidade para executar. Trabalhar com o TCU nesse momento é muito importante porque queremos fazer o melhor possível”, disse.
Voz do mercado
Participaram ainda algumas entidades, entre elas a Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão. Segundo Paulo Tonet, presidente Abert, a entidade estará sempre à disposição para auxiliar no que for útil. “A Abert tem por princípio não se envolver em questões de natureza comercial, por reunir uma série de TVs e rádios. Deixamos na entidade o que nos une e não que nos desune, e a concorrência fica do lado de fora. No entanto, reforço o princípio de que a a aplicação de verbas públicas atenda apenas e exclusivamente a critérios técnicos”, disse.
Ele comentou ainda que rádio e a televisão brasileira são responsáveis pelo conteúdo que colocam no ar, e a audiência é auditada com transparência da checagem externa. “Por isso é importante que se destaque a assimetria regulatória dentro do mercado entre rádio, televisão, e aqui podemos incluir sites e jornais brasileiros, e os nossos concorrentes que são veículos de comunicação que disseminam informação e entretenimento, que não tem obrigação de fiscalização. Isso se trata de uma concorrência desleal. Os grandes concorrentes que temos hoje não se submetem a nenhuma regra”, falou.
Para Marcelo Rech, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), a discussão necessita de muita cautela e de mais debate. “A primeira responsabilidade é com o dinheiro público. As verbas públicas não podem favorecer ou discriminar veículos de comunicação, muito menos por simpatias políticas; verbas públicas não podem financiar sites que promovem desinformação ou discurso de ódio; ela também não pode ser gasta se a correta aplicação não puder ser auditada ou conferida de forma independente e permanente; e todo dinheiro público deve ter transparência até o último centavo”, ressaltou.
Na visão de Cristiane Camargo, presidente da Interactive Advertising Bureau (IAB Brasil), todos os atores juntos são capazes de desenvolver o mercado da melhor forma possível. Para ela a discussão é complexa e requer equipes especializadas. “O grupo técnico que discutir isso precisa ser mais profundo do que nós. Temos que abrir espaço para que mais profissionais entrem nesse debate. Quanto mais ferramentas pusemos nas mãos deles, menos aflições e inseguranças nos processos”, disse.
Alarico Naves, representante da Associação Brasileira de Rádio e Televisão (Abratel), comentou que nem sempre somente a audiência é o melhor critério para escolher a veiculação de mídia. “É muito bom ver o TCU buscando essas discussões focado no interesse público”, afirmou.
Para Orlando Lopes, representante da Associação Brasileira de Agências de Publicidade (Abap) e da Federação Nacional das Agências de Propaganda (Fenapro), os setores privado e público precisam estar mais próximos. “A WFA está trabalhando muito próximo de Google, Facebook e outros para ter garantia que o investimento está sendo feito da melhor forma possível”, disse.
Além disso, ele ressaltou que a boa gestão de recursos é fundamental para garantir o propósito da comunicação. “Também acredito que é preciso alinhar as melhores práticas dos dois setores, medir o resultado das campanhas antes, durante, depois. Não importa se faz mais no canal A ou B. No final do dia alcançamos os objetivos? Por fim, acordar diretrizes de mídia que possam harmonizar e orientar todos os setores do governo e servir de base para avaliação do TCU. Precisamos criar guidelines que todos estejam de acordo. Isso serve de guia para monitoramento, otimização do tempo e principalmente da verba”, pontuou.
Fernando Rodrigues, representante do Centro de Altos Estudos em Controle e Administração Pública (Cecap), jornalista e proprietário do “Poder 360”, comentou que ainda que o dinheiro seja devolvido ou não pago quando um anúncio num site impróprio, há um dano de imagem. “Tenho duas observações de forma resumida: a primeira é o esforço para haver cada vez mais transparência por parte dos órgãos do governo, sobretudo da administração indireta. A outra é que no âmbito da administração pública brasileira, é muito importante que os veículos de comunicação sejam chamados pelo nome que tem: veículos de comunicação. Se tem tecnologia embarcada muito bom, mas eles são veículos de comunicação e assim devem ser tradados. […] Quando isso acontecer certamente haverá uma pressão maior nessas empresas para não fiquem apenas circunscritas a algoritmos”, disse.
Caio Barsotti, presidente do Conselho Executivo das Normas-Padrão (Cenp), lembrou que a entidade possui dentre seus objetivos sociais o de apoiar as autoridades nos seguintes termos: oferecer a seus associados e as autoridades constituídas, sempre que solicitado, assessoria técnica sobre boas práticas comerciais, leal concorrência, usos e costumes da indústria da propaganda. “Foi por isso que aceitamos o convite para este painel”, frisou.
O profissional listou ainda diversas ferramentas oferecidas pelo CENP ao mercado. “A quarta é o Cenp Meios, reconhecido como o melhor e mais acurado indicador do portal de compra de mídia realizado por meio das agências de publicidade, trata-se de iniciativa que contempla a disponibilização no site do Cenp dos valores investidos pelas agências por mídia separadamente contemplando TV aberta, TV por assinatura, jornais revistas, rádio e internet subdividida em busca, social, vídeo, áudio e display”, detalhou.
Google comenta debate de TCU, Secom e entidades sobre publicidade federal
O Google, bastante citado, não estava presente entre os participantes e se posicionou por meio de nota.
No texto, a empresa comenta a discussão sobre publicidade digital e afirma que respeita e opera em conformidade com a legislação brasileira. “Nossas plataformas de publicidade digital são utilizadas com sucesso no mundo todo, por anunciantes de todos os tipos e tamanhos, inclusive do setor público. No Brasil, nossas ferramentas possibilitam que instituições públicas alcancem dezenas de milhões de brasileiros, com eficiência e economicidade. Oferecemos controles robustos para que os anunciantes, tanto públicos quanto privados, possam escolher como e onde desejam exibir seus anúncios”, destaca a empresa.
Plataforma se posicionou sobre comentários no debate (Foto: Mitchell Luo / Unsplash)
Ainda na nota, a companhia ressalta que está aberta e disposta a participar deste “importante debate sobre os benefícios da publicidade digital e os usos relevantes para cada perfil de anunciante, sempre pautados por critérios técnicos e comprometidos com a transparência”. “Para nós, é uma prioridade preservar a confiança no ambiente de publicidade digital e contribuir para a manutenção de uma internet livre e aberta”, diz o fim da nota.
Recentemente, a Secretaria Especial de Comunicação Social da Presidência da República (Secom) abriu processo de concorrência para contratar três agências de publicidade. O contrato prevê valor de R$ 270 milhões ao ano.
A empresa foi citada em diferentes momentos do debate. Em um deles, Bruno Dantas, ministro do TCU, disse que há um certo jogo de empurra entre empresas estatais, Secom e o Google AdSense: o governo diz que não controla os sites que o algoritmo escolhe, e o Google diz que o cliente pode excluir os sites que deseja. “Nessa distribuição de responsabilidades, de quem é a culpa?”, provocou.
Em sua opinião, não cabe ao TCU ou qualquer instituição brasileira auditar o algoritmo da empresa, uma vez que o modelo de negócios do Google deve gozar de liberdade quando atua no setor privado. Mas há um porém: “Quando falamos do princípio da legalidade com o setor público e se o Google decide fazer negócios com o estado brasileiro, ele deve se sujeitar ao artigo 37, da legalidade estrita, segundo o qual o administrador e quem o contrata com administração pública somente pode fazer o que está previsto na legislação brasileira. Se o algoritmo do Google não é compatível com a Constituição brasileira, não é compatível com as leis brasileiras, o estado brasileiro não pode contratar o Google Ad Sense para suas campanhas publicitárias. Eu estou amadurecendo isso”, refletiu.
Em outro, Fernando Rodrigues, representante do Centro de Altos Estudos em Controle e Administração Pública (Cecap), jornalista e proprietário do “Poder 360”, comentou que ainda que o dinheiro seja devolvido ou não pago quando um anúncio num site impróprio, há um dano de imagem.
Entre as observações ele destacou que os veículos de comunicação deveriam ser chamados pelo nome que tem: veículos de comunicação. “Se tem tecnologia embarcada muito bom, mas eles são veículos de comunicação e assim devem ser tradados. […] Quando isso acontecer certamente haverá uma pressão maior nessas empresas para não fiquem apenas circunscritas a algoritmos”, disse se referindo a companhias como Facebook e Google.
Ainda em referência às gigantes digitais, Paulo Tonet, presidente Abert, comentou ainda que rádio e a televisão brasileira são responsáveis pelo conteúdo que colocam no ar, e a audiência é auditada com transparência da checagem externa. “Por isso é importante que se destaque a assimetria regulatória dentro do mercado entre rádio, televisão, e aqui podemos incluir sites e jornais brasileiros, e os nossos concorrentes que são veículos de comunicação que disseminam informação e entretenimento, que não tem obrigação de fiscalização. Isso se trata de uma concorrência desleal. Os grandes concorrentes que temos hoje não se submetem a nenhuma regra”, falou.