Capas de revistas pelo mundo refletem diferentes aspectos da pandemia
FOLHA DE S.PAULO – 06/05/2020
Daigo Oliva
Para muitos confinados, a quarentena é uma oportunidade para mergulhar no ócio criativo.
Para muitos outros, como jornalistas e designers de diferentes tipos de publicação, ser criativo é uma condição para que ocupem seus cargos.
A esses profissionais a pandemia de coronavírus trouxe não só uma rotina de trabalho mais pesada mas também obstáculos para retratar, com impacto, os diferentes aspectos da crise sanitária.
Revistas de moda, acostumadas com produções glamorosas, recorreram a ilustrações ou ao vazio.
Devido às medidas de isolamento social, as publicações enfrentam dificuldades para reunir um número grande de profissionais, entre fotógrafos, figurinistas, maquiadores etc., como geralmente ocorre.
Mesmo se fosse possível, tampouco haveria ambiente para tal.
Assim, a edição italiana da Vogue trouxe em abril uma capa toda em branco. “Em tempos como estes, uma capa silenciosa diz muito mais do que qualquer palavra ou imagem”, explica o diretor criativo da revista, Ferdinando Verderi.
Como criatividade é algo único, a versão canadense da revista Elle também fez o mesmo em sua edição de maio. Para não dizer que a ideia foi completamente decalcada, uma das letras “L” do nome da publicação aparece despencando e foi inserido um título: “Sozinhos, juntos, unidos em esperança”.
Já a também italiana Vanity Fair apostou em uma foto-ilustração de pegada nacionalista. No centro de um tecido com as cores da bandeira do país, um corte, representando a ferida aberta pelo vírus.
Publicações que tradicionalmente só utilizam ilustrações em suas capas também tiveram grande repercussão, caso da revista New Yorker.
A imagem do presidente dos EUA, Donald Trump, com uma máscara cirúrgica tampando seus olhos, na edição do início de março, tornou-se um símbolo da crise, uma vez que o líder republicano vinha, até então, minimizando os impactos do coronavírus no país.
Outro desdobramento provocado pela pandemia foi a multiplicação dos entregadores via aplicativos. Sem ter como trabalhar devido às restrições, muitas pessoas passaram a atuar na área, de conhecidas condições precárias e baixa remuneração.
A New Yorker também retratou esse aspecto, com uma capa impactante e silenciosa. Numa noite chuvosa, um rapaz toca a campainha de um prédio em Nova York. Nas costas, o DNA desses trabalhadores: a mochila quadrada para levar as entregas. No canto, a bicicleta encostada.
Sem muitas delongas, a britânica The Economist resumiu o mundo em “lockdown”. Pendurada no globo, uma placa de “fechado”, como se faz em estabelecimentos comerciais.
A revista Time não decalcou a ideia, mas também partiu das placas de lojas para fazer uma de suas capas. Com um jogo de palavras, transformou “open” (aberto) em “nope” (não).
A revista holandesa De Groene Amsterdammer, menos conhecida internacionalmente, ficou no meio termo entre a ilustração e o vazio. Numa edição sobre como colocar em prática a filosofia do ócio na quarentena, optou pelo desenho de uma folha de calendário —sem nenhuma atividade programada.
Os que usaram fotografias, em sua maioria, foi para registrar profissionais de saúde. Os rostos cansados, marcados pelo uso intenso de equipamentos de proteção, ilustraram as capas das revistas do jornal The New York Times e da Marie Claire mexicana.
No caso da publicação dos EUA, um episódio trágico marcou a produção. Durante a realização do ensaio, o fotógrafo italiano Andrea Frazzetta perdeu a mãe, vitíma de Covid-19.
A imagem da revista de moda, por sua vez, viralizou, com um retrato de uma médica. O título também chamou a atenção: “Os Influencers de Verdade – A Resiliência Tem Cara de Mulher”.