Como jornalistas de 19 países conduziram uma investigação internacional sobre violência de gênero

Como jornalistas de 19 países conduziram uma investigação internacional sobre violência de gênero

9 de julho de 2020
Última atualização: 9 de julho de 2020
Helio Gama Neto

IJNET – 09/07/2020

NICOLE MARTIN Y CARLOS MAYORGA

Assim que o primeiro caso de coronavírus na América Latina foi confirmado, em 26 de fevereiro no Brasil, a maioria dos países da região começou, um a um, a decretar a quarentena obrigatória. Com base no alerta de diferentes organismos internacionais de que o isolamento levaria a um possível aumento de casos de violência de gênero, 28 jornalistas da Red Latinoamericana de Jóvenes Periodistas do Distintas Latitude, em aliança com duas jornalistas da Chicas Poderosas, se juntaram para revelar a situação regional da violência de gênero em uma matéria multimídia especial: “Violentadas en cuarentena” (ainda em construção).

Juntamente com Ketzalli Rosas, codiretora do Factual, coordenamos e editamos a pesquisa. O resultado de um mês de trabalho foi um microsite com um panorama da região, quatro visualizações de dados e 19 artigos sobre cada um dos países latino-americanos que fizeram parte da investigação.

O especial foi elaborado e programado por Alma Ríos e publicado em 30 de abril de 2020. Entre as principais constatações, foi a confirmação do aumento do número de pedidos de ajuda em quase todos os países. Descobrimos que Cuba é o único país que não menciona a violência contra as mulheres em sua legislação e que alguns governos de países como Argentina, Chile e Colômbia implementaram estratégias de denúncia de quarentena.

A matéria nasceu de uma sessão de capacitação da Red Latinoamericana de Jóvenes Periodistas sobre investigação de corrupção. A partir dessa reunião, surgiu uma aliança que começou com nós duas e se espalhou para uma equipe de 49 pessoas: quatro coordenadores, 28 jornalistas e 17 ilustradores. Com o precedente de uma investigação que já estava em andamento na Argentina, perguntamos sobre o estado da violência de gênero — contra mulheres e outras identidades de gênero — e as ações que os Estados estavam adotando para enfrentá-la.

No entanto, descobrimos que, apesar de haver ataques maciços contra pessoas LGBTIQ + na América Latina, as leis latino-americanas que abordamos neste projeto sintetizam “violência de gênero” em “violência contra mulheres” e não incluem outras identidades, motivo pelo qual não produzem números sobre a violência contra a comunidade LGBTIQ + durante a quarentena.

Selecionamos algumas linhas para aprofundar: a legislação dos países, o número de reclamações judiciais, o número de pedidos de ajuda e o número de feminicídios. Como não sabíamos o que encontraríamos no início da investigação, o primeiro impulso foi tentar tornar tudo comparável. No entanto, como era impossível fazê-lo, resolvemos fornecer o quadro mais abrangente da violência contra as mulheres durante a pandemia, sem pretender comparar a situação entre os países.

Conhecemos essas informações através das contribuições contextuais de cada membro da pesquisa. Uma boa ferramenta para delinear uma investigação internacional são os Google Forms, que permitem mobilizar perguntas para fornecer pistas sobre quais podem ser as melhores maneiras de começar a investigar e as perguntas que devem ser feitas, pois desde o início deve-se supor que os sistemas de informação, legislação e construções da sociedade são diferentes em cada país. A contribuição da equipe de jornalistas de cada país nos ajudou a entender a situação por país para a construção do texto central, que estava sendo desenvolvido simultaneamente à medida que a investigação avançava.

O primeiro obstáculo que encontramos como equipe foi acessar informações em países como Bolívia, Venezuela, Cuba, Nicarágua e Guatemala; e também em outros, como Brasil e México, que têm os dados divididos por cada estado. Na maioria dos casos, o problema foi resolvido com dados de ONGs ou deixando clara a impossibilidade de acessar determinadas informações, pois isso já era um fato.

Além disso, era necessário se concentrar em não cair na revitimização das mulheres do jornalismo. Portanto, embora quiséssemos contar as histórias de vítimas de violência de gênero na primeira pessoa, decidimos focar em dados gerais e disponibilizar um formulário, como banco de histórias, disponível para pessoas que desejam nos contar sobre um fato relacionado a violência contra as mulheres. Os testemunhos nos ajudarão a complicar o panorama da violência de gênero na América Latina.

Finalmente, o plano de disseminação da pesquisa foi fundamental para alcançar o impacto que desejávamos. Graças à nossa aliança, a investigação foi replicada em 13 mídias no México, Colômbia, Argentina, Cuba, El Salvador, Guatemala e Paraguai. A equipe de jornalistas também foi convidada para uma discussão com a Unidade de Investigação Jornalística da Universidad Politécnico Grancolombiano (Colômbia) para discutir a metodologia da investigação.

Atualmente, a “Violentadas en cuarentena” está trabalhando em um segundo estágio de investigação que será publicado nos próximos meses. Será um espaço de memória para as vítimas de violência de gênero na América Latina.


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Helio Gama Neto