Adriano Rodrigues: A perda de visibilidade das empresas de notícias em tempos de Inteligência Artificial

Novidade na Associação Nacional de Editores de Revistas (Aner)! Nos sentimos honrados por ter entre os nossos colunistas o professor Adriano Rodrigues, que se junta ao time para uma análise profissional e acadêmica dos assuntos que rondam o meio publishing. Nesta estreia, ele faz uma análise do relatório Reuters sobre as notícias selecionadas e resumidas por inteligência artificial e os desafios que isso representa para as empresas jornalísticas. Boa leitura!
Este é o primeiro artigo que escrevo para o portal da Aner e estou muito feliz com isso. Nessa estreia trago aqui minhas impressões retiradas do relatório, Journalism and Technology Trends and Predictions 2025, que mostra as tendências do mercado de jornalismo digital. O relatório produzido para o Reuters Institute e a University of Oxford tem autoria de Nic Newman (pesquisador associado sênior no instituto Reuters para estudo do jornalismo) e Federica Cherubini (diretora de desenvolvimento de liderança no instituto Reuters para estudo do jornalismo e especialista em operações de redação e mudança organizacional).
O relatório está dividido em dez partes e aqui, neste artigo, estamos trabalhando a parte dois do relatório (Disruption of Search Poses Existential Challenge). Ela mostra que a interrupção das buscas representa um desafio existencial para as empresas de mídia nas questões de perda de visibilidade.
O estudo foi produzido pela empresa Chartbeat com 1.899 sites de notícias e mídia da América do Norte (30%), da Europa (40%) e do resto do mundo (40%). Nic Newman e Federica Cherubini mostram a preocupação dos editores dos sites de notícias em relação à redução dos links de referências, em virtude dos grandes players integrarem seus conteúdos a resumos gerados por inteligência artificial.
Declínio nas buscas sem IA?
No relatório percebe-se de imediato a queda significativa do tráfego das redes sociais como Facebook, o X (antigo Twitter), e o Instagram. O Facebook sofreu uma redução de 67%, o X (antigo Twitter) caiu 50%, e o Instagram registrou uma queda de 26%. Os dados colhidos no relatório mostram uma forte tendência do impacto da inteligência artificial nos sites de notícias (nos últimos dois anos) e nas mudanças de plataforma das redes sociais.
Para algumas empresas o cenário não é tão catastrófico, já que o tráfego do Google Discover aumentou em 12% a visibilidade dos sites de notícias, mas outras empresas discordam disso. Embora o relatório destaque um aumento de 12% no tráfego proveniente do Google Discover, há controvérsias entre as editoras. Algumas afirmam que o tráfego geral do Google começou a apresentar declínio devido aos resumos gerados por IA. Pela minha experiência, eu fico com a segunda afirmação.
Já que as IAs estão gerando as respostas das buscas em forma de resumos, será que as pessoas estão clicando nos links de referências dos sites de notícias para terem suas respostas? Ou se contentam com os resumos gerados pelas IAs? Sugiro que veja em seu Analytics e me conte aqui, depois.
Inteligência Artificial e acordos de licenciamento pelo mundo
Voltando às preocupações dos sites de notícias espalhados pelo mundo, a OpenAI firmou um acordo de licenciamento, avaliado em cerca de 250 milhões de dólares ao longo de cinco anos, com grandes empresas de mídia, incluindo Reuters, AP, Financial Times e Le Monde. O acordo permite que o Search GPT (que foi lançado em 2024) use as notícias dessas mídias licenciadas para trazer resultados confiáveis e sem alucinações em suas pesquisas feitas pelos usuários. Por enquanto o Google optou por pagar especificamente por conteúdos de inteligência artificial, enquanto o X atualizou seus termos de serviços para permitir que os conteúdos publicados em sua plataforma sejam usados sem o consentimento explícito ou sem compensação.
Veja o exemplo abaixo trazido pelos autores da pesquisa. O texto gerado pelo Search GPT traz resultados que respondem diretamente à dúvida do usuário, trazendo informações mais precisas, sem os tradicionais links de referências entregues pelo modelo do Google. Perceba que os links de referência estão no final de cada bloco de informação e a ferramenta traz apenas os links de referências das empresas que firmaram o acordo de licenciamento.

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Serviços de notícias personalizados, em tempo real, feitos por IA
Acredito que os resultados trazidos das buscas feitas no Search GPT vão prejudicar os sites de notícias de três formas:
- A primeira é que o resultado gerados pelas LLM (Large Language Models) da Open IA é um compilado de informações criadas pelas empresas conveniadas, a questão é, como ficam as empresas de mídia que não são conveniadas?
- A segunda forma é que mesmo as empresas conveniadas, que firmaram acordos com o OpenAI não terão muitos acessos aos seus sites, já que a resposta trazida pela pesquisa (dentro do Search GPT) já entrega o que o usuário precisa, entrega um resultado bem montado e os links de referências aparecem de forma bem discretas e ainda, o usuário pode conversar com o ChatGPT sobre a entrega trazida na pesquisa, eu acho isso incrível para o usuário, mas preocupa as empresas de notícias.
- O terceiro problema é que com este novo cenário, as empresas de mídia que fizeram a parceria receberam um tratamento especial e minha pergunta é: como ficarão as outras milhões de empresas que ficaram de fora deste acordo? Para a Open IA a parceria é boa, pois eles trarão para seus usuários resultados mais críveis, que foram feitos, verificados e trabalhados por jornalistas profissionais, e além do que, acredito que além de resultados críveis, o sistema de inteligência artificial está sendo treinado.
Além da OpenAI com o SearchGPT, plataformas como Perplexity e ProRata.ai estão criando serviços de notícias personalizados e em tempo real. A ProRata.ai, em particular, busca calcular a contribuição de conteúdos para resumos gerados por IA, oferecendo mecanismos para que editoras sejam remuneradas de forma mais equitativa. A similaridade entre esses modelos de negócio reside na utilização de LLMs (Large Language Models) e índices de informação em tempo real para aprimorar a experiência de pesquisa.
Cenários possíveis para 2025
O relatório destaca a preocupação das editoras com a perda de tráfego de referência para seus sites, já que a tendência é que os usuários se contentem com os resumos gerados pela IA sem clicar nos links originais.
Os autores da pesquisa apontam o que pode acontecer em 2025 na questão que estamos tratando aqui. Eles apontam três possíveis cenários:
- O primeiro é sobre a pressão que os editores podem fazer ao governo, um pedido de ajuda para forçar as plataformas a pagar por uma compensação adequada pelo uso dos seus conteúdos. Um exemplo que eles demonstram é uma reformulação do “código de negociação” de notícias que foi introduzido pela primeira vez na Austrália, onde gerou cerca de 200 milhões de dólares australianos por ano, das plataformas.
- O segundo cenário possível envolve ações legais em andamento, nas quais editoras canadenses e o New York Times estão entre aqueles que buscam indenização da OpenAI por usar artigos sem autorização para treinar modelos de inteligência artificial.
- Por fim, o terceiro cenário mostra novas plataformas mudando a lógica de uso dos conteúdos jornalísticos. Eles citam como exemplo o surgimento da ProRata.ai, da Tolibit e Human Native, que estão procurando calcular contribuições de artigos gerados por IA. Desta forma, essas empresas oferecem mecanismos para que as editoras menores e maiores sejam pagas. Os exemplos que dão é que o Financial Times, a Fortune, a Axel Springer e o The Atlantic concordam em licenciar seus conteúdos para a ProRata.ai, enquanto as editoras dinamarquesas estão fazendo parcerias de forma coletiva para garantir que todo ecossistema se beneficie.
Com isso, apresento minhas reflexões sobre a parte 2 do relatório Jornalismo e Tecnologia – Tendências e Previsões para 2025. Espero que tenha gostado e se quiser pode deixar um comentário para fomentar o debate. Até o próximo artigo.
A imagem de abertura foi criada pela Inteligência Artificial do Google pelo autor do artigo com o seguinte prompt: Create a minimalist, flat design illustration for an article about media companies losing visibility in search engines due to artificial intelligence. The image should include: a falling bar or line graph representing traffic, a stylized magnifying glass symbolizing search, and a discreet robot with a neutral face in the background. Use soft tones of blue and gray, with a light blue background to highlight the main elements. The composition should be clean, modern, and convey the idea of decline in a visually striking way, without excess.