ANJ quer que Google remunere conteúdo jornalístico

ANJ quer que Google remunere conteúdo jornalístico

4 de março de 2021
Última atualização: 4 de março de 2021
Helio Gama Neto

O ESTADO DE S.PAULO – 04/03/2021

Após exemplos internacionais, associação que representa veículos jornalísticos no Brasil move ação no Cade para avançar discussão.

Inspirada pelos acordos internacionais para o uso de conteúdo jornalístico entre empresas de mídia e gigantes da tecnologia, a Associação Nacional de Jornais (ANJ) pede ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) uma ampliação da investigação contra o Google no Brasil, visando à remuneração de veículos nacionais pela companhia. A ANJ instaurou um inquérito administrativo contra o Google em julho de 2019 sobre o assunto, que ainda não foi transformado em investigação formal.

A pressão é uma reverberação de debates que estão acontecendo no mundo todo. Em fevereiro, a Austrália foi o primeiro país a aprovar uma legislação que força as gigantes de tecnologia a negociarem com veículos de mídia o licenciamento de notícias em suas plataformas.

“Estamos abastecendo a ação com informações das regulações que estão sendo implementadas em países como Austrália e França, quanto à remuneração da atividade jornalística como um todo”, afirma Marcelo Rech, presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ). “A Austrália abriu um novo horizonte no entendimento de que as plataformas digitais geram desinformação, fake news, discurso de ódio e incitação à violência. Quem tem a capacidade de fazer a limpeza das plataformas é o jornalismo profissional”.

Na visão de Márcio Bueno, da Caminati Bueno Advogados, que representa a ANJ no Cade, o inquérito administrativo, com o impulso das novas regulações internacionais, está maduro o suficiente para uma investigação formal.

“Infelizmente, o que está acontecendo fora do Brasil não está acontecendo aqui. O Google tem feito acordos individuais com veículos no Brasil, mas enxergamos essas parcerias com preocupação e ceticismo porque em uma negociação com uma empresa do tamanho do Google, há margem para termos e condições abusivas”, afirma Bueno.

Para ele, o momento é oportuno para que as negociações avancem. “Sentimos que há uma inércia na ação, enquanto outros países estão andando com esses pedidos de uma forma mais avançada”, diz.

Procurado pela reportagem, o Google diz que tem “cooperado com o Cade para esclarecer dúvidas desde 2019”. A empresa afirma que “apoia o futuro do jornalismo gerando tráfego, desenvolvendo ferramentas que ajudam a criar novos modelos de negócios e treinamentos, bem como por meio de fundos e parcerias sólidas com toda a indústria”.

Segundo Rech, apesar de a ação no Cade ser focada no Google, a ANJ está começando a discutir também uma legislação específica que faça essa remuneração nos moldes do que acontece na Austrália, incluindo também outras gigantes de tecnologia, como o Facebook. Enquanto na Austrália a lei foi movida pelo órgão antitruste do país, o caminho para implementar uma legislação semelhante no Brasil seria o Congresso.

Pressão mundial
A Austrália tornou-se pioneira quando aprovou em 25 de fevereiro uma legislação que força as empresas de tecnologia a negociar com veículos de mídia o licenciamento de notícias nas plataformas. Durante a elaboração do projeto, Google e Facebook, os mais afetados pela nova lei, ameaçaram sair do país por supostos prejuízos ao modelo de negócios. Apesar de criticarem publicamente a legislação, as “Big Techs” fecharam acordos.

O Google anunciou que fechou parceria com veículos australianos, como o grupo News Corp.,do bilionário Rupert Murdoch, que seriam pagos por meio da ferramenta Destaques, que foi lançada na Austrália em 4 de fevereiro. A ferramenta também está disponível no Brasil desde outubro de 2020.

Já o Facebook, antes de fechar acordo com o governo local e anunciar o lançamento da plataforma News no país, bloqueou o compartilhamento de notícias para usuários australianos do dia 17 a 23 de fevereiro.

Inspirada no movimento australiano, a União Europeia e o Reino Unido declararam nas últimas semanas que podem exigir que as gigantes também paguem pelo uso de conteúdos noticiosos. Os parlamentares europeus querem implementar sistemas para compensar o desequilíbrio das Big Techs nas plataformas digitais.

Já a França conseguiu em janeiro um acordo similar, após intervenção da autoridade de competição do país a pedido da Alliance de la Presse d’Information Generale, organização que representa os jornais franceses. Assim como na Austrália, o Google fez parcerias individuais com veículos locais e pagou pelo conteúdo por meio do produto Destaques.

 


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Helio Gama Neto